Nas últimas semanas na Câmara de Vereadores de Maceió tem sido discutido o Projeto de Lei 11/2021 da vereadora Gaby Ronalsa (DEM), o PL do “Dia do Nascituro” e da “Semana da Vida”, uma proposta de Lei absurda e inconstitucional, que vem para violentar mulheres e meninas, e ameaçar seus Direitos Reprodutivos já conquistados.
De
acordo com informações do portal de jornalismo independente Mídia Caeté, o projeto
de lei propõe possibilitar a realização de campanhas contra o aborto, inclusive
contra situações que já são previstas em lei, como em casos de mulheres e
meninas vítimas de estupro, gestantes sob risco de vida e em casos de fetos anencefálicos, e executar essas campanhas em escolas, postos de saúde e outros
espaços públicos.
Esse
tipo projeto de lei não é novidade para os movimentos de mulheres de Alagoas e
do Brasil, já que ele faz parte da política criminosa e conservadora do governo
Bolsonaro. Além disso sabemos que em situações de retiradas de direitos, como
são as práticas cotidianas desse desgoverno, os direitos das mulheres costumam
estar sempre ameaçados. O ministério de Damares Alves, as bancadas da bíblia
espalhadas pelo país, e os movimentos conservadores pró-vida, estão sempre
dispostos a promover novos ataques aos direitos reprodutivos de mulheres e
meninas, e pouco interessados com suas vidas e com sua segurança.
Segundo
o artigo 128 do Código Penal e a ADPF 54, é garantido o direito ao aborto
seguro no Brasil nos seguintes casos: se a gravidez é decorrente de estupro; se
a gravidez representar risco de vida à mulher; e se for caso de anencefalia
fetal, ou seja, não há desenvolvimento cerebral do feto. Qualquer hospital que ofereça
serviços de ginecologia e obstetrícia deve ter equipamento adequado e equipe
treinada para realizar abortos nessas situações. Esses dados são do Mapa Aborto
Legal, uma iniciativa da ARTIGO 19, uma organização não-governamental de
direitos humanos. O mapa propõe monitorar, centralizar e compartilhar
informações públicas sobre aborto legal, como legislação e os estabelecimentos
do SUS que oferecem o procedimento.
O
PL da vereadora de Maceió Gaby Ronalsa, que propõe a instituição do “Dia do
Nascituro” e da “Semana da Vida” é completamente inconstitucional, tendo em
vista que ataca vários princípios da Constituição Federal. Esse projeto tem
referências na Lei Estadual nº 8127/2019 do deputado Dudu Ronalsa (PSDB), que
estabelece o Dia do Nascituro em Alagoas, e no PL 478/2007 o “Estatuto do
Nascituro” dos Deputados Federais Luiz Bassuma (na época no PT) e Miguel Martini (na época PSB), dois mecanismos que
propõem uma narrativa de “proteção da vida”, mas que na verdade compõem
ferramentas de morte de mulheres e meninas. O projeto da vereadora de Maceió ataca
a Constituição Federal ao ir de encontro ao Estado Laico, pois pretende a
articulação de ações de campanha do município de Maceió com Igrejas, promovendo
pregação religiosa dentro de escolas e outros espaços públicos, desfazendo
assim a separação entre Estado e Religião, e acima de tudo, ataca o princípio
de prioridade na proteção de crianças e adolescentes contra violência, abuso e
exploração sexual.
Dados
do ano passado do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, reportam que somente
no primeiro semestre de 2020, foram registrados 25.922 casos de estupro no
Brasil, desses casos 22.573 das vítimas eram do sexo feminino. Esse mesmo
relatório trata dos casos de estupro de vulnerável e apresenta que no primeiro
semestre de 2020, cerca de 14.959 meninas menores de 14 anos foram vítimas de
estupro.
Em
agosto de 2020 foi amplamente divulgado o caso de uma criança de 10 anos do
Espírito Santo que engravidou após ser violentada por um tio desde os 6 anos de
idade. A criança, que há 4 anos era vítima de violência sexual, foi violentada
novamente, constrangida e violada ao ser exposta na mídia e ter sua vida de
menina de 10 anos transformada em palanque político pela ministra Damares e
seus cúmplices dentro e fora do governo. Após passar por um processo de
revitimização e quase ter seu direito ao aborto seguro e legal negado, a
criança teve que mudar de estado para que seus direitos fossem garantidos. Essa
infelizmente é a realidade de milhares de meninas vítimas de violência sexual
diariamente, e é o direito dessas meninas que também tem sido atacado no
projeto de lei da vereadora de Maceió.
O
PL 11/2021 propõe impedir que as mulheres acessem seus direitos, constranger,
intimidar e violentar mulheres e meninas que foram vítimas de violência sexual,
ou que se enquadrem nos outros casos previstos no artigo 128 do Código Penal e
na ADPF 54, e promove também deseducação no que diz respeito à proteção de
crianças e adolescentes, tendo em vista que hostiliza e expõe meninas que estão
sendo vítimas de violência, invalidando inciativas de educação sexual que
orientam as crianças sobre os caminhos para pedir ajuda em caso de violência
sexual.
Um
dos princípios do Coletivo Mulheres Resistem, presente em nossa Base de Acordo,
trata do direito da mulher à sua saúde. Nós defendemos o direito de todas as
mulheres aos seus corpos, que todas tenham acesso digno à saúde, tenham o
direito de contar com todos os recursos disponíveis para não engravidar, o
direito à uma educação em saúde autônoma e libertadora que lhes garanta
informação, que quando as mulheres desejarem engravidar tenham acesso à
serviços humanizados e livres de violências obstétricas e institucionais, e
defendemos também a descriminalização do aborto. Sabemos que mulheres abortam,
a criminalização do aborto não impede que as mulheres o façam, mas sustenta uma
realidade em que ele aconteça em situações precárias, e de risco à vida dessas
mulheres. Defendemos a descriminalização do aborto para que mulheres pobres não
morram diariamente.
Nossa
luta é pelo fortalecimento de políticas públicas de saúde voltadas à educação
sexual e reprodutiva, de modo que as mulheres adquiram conhecimento sobre seu
corpo e sua sexualidade. Ainda mais, é preciso lutar cotidianamente e
coletivamente contra a cultura machista e patriarcal que domina nossa sociedade,
e contra os ataques frequentes aos nossos direitos, Mulheres Resistem!
Anuário
Brasileiro de Segurança Pública 2020:
https://forumseguranca.org.br/wp-content/uploads/2021/02/anuario-2020-final-100221.pdf
Artigo
128 do Decreto Lei nº 2.848 de 07 de Dezembro de 1940:
Dia
do Nascituro e as campanhas contra o aborto previsto em lei
Lei
Estadual nº 8127/2019 do Dia do Nascituro
https://sapl.al.al.leg.br/media/sapl/public/normajuridica/2019/1622/promulgacao_lei_8127-2019.pdf
Mapa
Aborto Legal:
PL
do Dia do Nascituro: discussão tem boneco de feto, ofensa a feministas, e
termina com pedido de vistas
PL
478/2007 do Estatuto do Nascituro:
https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=345103
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