O processo de escravização iniciado a
partir da colonização do Brasil transformou homens e mulheres negros(as) em
objetos/mercadorias, sendo instituído todo um sistema de dominação e exploração
de sua força de trabalho; sistema esse que construiu e determinou nossa
identidade nacional, a qual vem na contramão da consolidada idéia de
“democracia racial” vigente em nossa sociedade.
A mulher negra, particularmente, no período
colonial tinha a função de servir a seus “donos”, em todos os aspectos, seja
com trabalhos domésticos ou como objeto sexual. Assim, a construção histórica
da identidade da mulher negra e a violência sexual perpetrada no período
colonial refletem o modo como as relações de gênero e raça configuram-se
atualmente. As relações sociais em nossa sociedade, ainda retratam o período
escravista.
As mulheres negras ainda exercem trabalhos
servis (empregada doméstica, babá, cozinheira, etc.), fazem parte da parcela da
sociedade (pobre, periférica e oprimida) que tem menos acesso (ou não tem) à
educação e à cultura; sofrem muito mais com o padrão de beleza normatizado e
imposto (modelo da mulher branca), pois o estereótipo de beleza vigente
determina desde o modo como a mulher negra se enxerga, enquanto pertencente a
uma descendência com características físicas peculiares – e, portanto, que
mudanças visuais e estéticas se impõem para enquadrar-se e ser aceita
socialmente –, até a aquisição de uma vaga o mercado de trabalho (quantos não
são os anúncios de emprego que exigem “boa aparência”?).
Desse modo, a luta das mulheres negras tem
questões que o feminismo clássico (tomando como referência o feminismo europeu),
ao trabalhar a opressão feminina, ainda não conseguiu se apropriar e engendrar
forças para sua superação. Isso acontece porque a luta das mulheres negras está
para além da luta contra a opressão masculina; as mulheres negras ainda
precisam lutar contra o preconceito racial e, por que não dizer também, contra
a pobreza e a exploração que as mantêm reféns de trabalhos servis, extenuantes
e mal remunerados. Assim, nos questionamos: que mulheres as conquistas
feministas, na sociedade brasileira, favoreceram?
Mais que voltarmo-nos para a variável
gênero e a busca pela superação da construção histórica da dominação masculina,
devemos articular e aglutinar nossas forças na luta relacionada às questões de
classe e raça também. Só seremos libertas da opressão se todos os tipos de
opressão forem eliminados. Só assim alcançaremos a real unidade na luta das
mulheres, quando entendermos que existem formas complementares de dominação e
exploração que dão corpo e fortalecem a opressão de gênero vivida
cotidianamente pelas mulheres. A liberdade da mulher só virá com a libertação
humana!
A feminista norte-americana Patricia
Collins elege alguns “temas fundamentais que caracterizariam o ponto de vista
feminista negro”. Entre eles, se
destacam: o legado de uma história de luta, a natureza interconectada de raça,
gênero e classe e o combate aos estereótipos ou “imagens de autoridade”.
Acompanhando o pensamento de Patricia
Collins, Luiza Barros usa como paradigma a imagem da empregada doméstica como
elemento de análise da condição de marginalização da mulher negra. Conclui,
então, que “essa marginalidade peculiar é o que estimula um ponto de vista
especial da mulher negra, (permitindo) uma visão distinta das contradições nas
ações e ideologia do grupo dominante”. “A grande tarefa é potencializá-la
afirmativamente através da reflexão e da ação política”.
Desse modo, trazemos como símbolo da
resistência e da luta dos negros no Brasil, de modo geral, e das mulheres
negras, em particular, o dia 20 de novembro. É inegável o protagonismo e a
importância da mulher negra na luta contra a escravidão e na formação dos
quilombos. Resgatar o papel histórico da mulher negra na luta por uma sociedade
mais justa, igualitária e livre de opressões é imprescindível para o
fortalecimento da luta feminista no Brasil.
Por uma sociedade multirracial e
pluricultural, onde as diferenças se tornem equivalência e não mais
subordinação!
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